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Por que a restauração da Pirâmide de Miquerinos está gerando discórdia no Egito

Mais de 4.500 anos depois, a menor das três Pirâmides de Gizé passa por obras – para alegria de uns, horror e indignação de outros, gerando discórdia. Não é a primeira vez que cuidado do patrimônio histórico desperta críticas no país.


as três pirâmides do egito com foco na de miquerinos
A Pirâmide de Miquerinos em primeiro plano, atrás dela a Pirâmide de Quéfren e a Pirâmide de Quéops© KHALED DESOUKI/AFP/Getty Images

Com 62 metros de altura – mais ou menos o equivalente a um prédio de 20 andares –, a Pirâmide de Miquerinos é a menor das três pirâmides do planalto de Gizé. Ao lado dela, erguem-se em direção ao céu egípcio a Esfinge e as pirâmides maiores de Quéops (138 metros) e Quéfren (136 metros), verdadeiros ímãs turísticos. O faraó Miquerinos mandou erigí-la entre os anos 2.540 e 2.520 a.C. para fazer dela sua tumba. Agora, a administração de antiguidades do Egito acha que chegou a hora de renová-la.


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Arqueólogos egípcios e japoneses já começaram a reconstruir o revestimento externo de granito nos quatro lados da Pirâmide de Miquerinos. Mostafa Waziri, chefe da administração de antiguidades egípcias, fala de um "projeto do século".


Num vídeo postado no Facebook em 26 de janeiro, Waziri mostra trabalhadores colocando na base da pirâmide blocos de granito que desde um terremoto se encontravam espalhados ao redor da estrutura. Originalmente, o revestimento externo da Pirâmide de Miquerinos era constituído por 16 blocos de granito.


Os trabalhos devem durar três anos e o resultado será "o presente do Egito ao mundo do século 21", diz Waziri.


A postagem, no entanto, não foi bem recebida. Uma especialista chegou a descrever o projeto como "absurdo". "Agora só falta cobrir a Pirâmide de Miquerinos com azulejos!", ironizou Monica Hanna, em discórdia, uma das principais egiptólogas do país, numa entrevista à agência de notícias AFP. Tal forma de tratar a herança cultural egípcia deve parar, acrescentou Hanna num posicionamento publicado no Facebook. "Todos os princípios internacionais para renovação proíbem tais intervenções."


Segundo a especialista, não há evidências de que os blocos de granito estivessem posicionados sobre a pirâmide. "Portanto, qualquer tentativa de revestir os blocos ao redor da pirâmide é uma interferência flagrante no trabalho original dos construtores."


O vídeo de Waziri atraiu comentários indignados de dezenas de internautas. Alguns reagiram inclusive com sarcasmo: "Para quando está planejado o projeto de endireitamento da Torre de Pisa?", perguntou um deles. De fato, houve no passado repetidas tentativas de endireitar ou pelo menos estabilizar a torre inclinada da cidade italiana. Atualmente, a atração turística toscana tem uma inclinação de quatro graus, e é considerada segura – pelo menos por enquanto.


Debate sobre a proteção do patrimônio cultural

O turismo também é muito importante para o Egito, com as pirâmides entre os principais atrativos do país. De acordo com os números mais recentes do Banco Mundial, coletados antes da pandemia de covid-19, 13 milhões de turistas visitaram o Egito em 2019, com cerca de 2,5 milhões de pessoas – quase 1 em cada dez egípcios – trabalhando no setor. Isso faz do turismo uma das principais fontes de renda para o país, representando importantes receitas em divisas.

Isso em si já explica a importância dada à questão da preservação do patrimônio cultural. O tema, muitas vezes, acaba suscitando debates acalorados, como mostra o exemplo do centro histórico do Cairo. Repetidamente, decadência e destruição de bairros históricos desencadeiam protestos da sociedade civil, como relata o portal online egípcio Papyrus, uma iniciativa nascida a partir de uma cooperação teuto-egípcia para o desenvolvimento.

A mesquita Abu al-Abbas al-Morsi, do século 15, fica na cidade costeira de Alexandria, a segunda maior cidade do Egito, e também gerou polêmica recentemente. Uma empreiteira encarregada da reforma decidiu, sem consulta prévia, pintar de branco os tetos históricos da maior mesquita da cidade, conhecida por suas esculturas e cores, informou a agência de notícias AFP. As autoridades locais já teriam anunciado uma investigação sobre o caso.


Japão deve arcar com custos do projeto

Para alguns críticos, a restauração da Pirâmide de Miquerinos vem em má hora, em meio a uma recessão econômica. Segundo o portal de notícias egípcio National, o Egito terá que reembolsar 32 bilhões de dólares (R$ 157 bilhões) em empréstimos estrangeiros. A crise da dívida é exacerbada ainda mais pela alta da inflação e por um declínio acentuado do comércio no Canal de Suez, uma importante fonte de receitas para o governo egípcio. No entanto, o líder do projeto, Waziri, rejeitou as críticas numa entrevista televisiva – a primeira fase do projeto, afinal, será financiada pelo Japão.

Reportagem: Deutsche Welle por Stefen Dege


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